11.10.2010

Onde guardei minha ilusão.

Felicity estava andando tranquilamente com seu cachorro, um labrador, a acompanhá-la. Cega, apenas podia sentir a leve brisa em seu rosto, o perfume sutil de rosas e o sabor de delicadeza que aquelas sensações a transmitiam.

Do lado de fora da cabeça da garota víamos tumulto, coco de cachorro, esterco de cavalo ou de vaca, ladrões, marginais e prostitutas. Uma mendiga passava ao seu lado com rosas murchas. As cores da cidade eram cinza e preto, o mesmo preto que Felicity admirava desde que nascera.

Cada um tem seu mundo. O mundo daquela garota era tranqüilo, alegre, agitado e belo. O mundo da mendiga era fétido, ríspido, rigoroso e sujo. A prostituta não queria mais ter mundo. O ladrão queria o de todos para si. Era sangue, dor entortada. Era ódio, amor dilacerado. Poderia ser qualquer sentimento, mas ele seria o que regeria o mundo de cada um.

Felicity já evitava chorar. Para ela era uma dádiva estar naquele lugar. A mendiga viva chorando, pedindo comida quando não tinha rosas para vender. A prostituta não chora porque se cansara de sentir algo. E o ladrão... Ah, esse ladrão! Esse sim chorava implorando perdão, enquanto em seu íntimo era mais feliz que Felicity, por não ser perdoado.

Cada um tem seu sentir. Nenhum é igual ao outro e é isso que faz essa estória ter sentido. Tudo existe graças ao que Felicity, a mendiga, a prostitua, o ladrão, e tantos outros sentem. È possível que eles façam parte de um todo, um bem confuso, cheio de conflitos e crises de identidade.

Foi aí que guardei... Aguardei minha ilusão chegar. No momento mais confuso onde fiquei inerte. Meu mundo não é igual ao de ninguém. Nem Felicity, nem a mendiga, nem a prostituta, nem o ladrão, nem tantos outros. Foi aí, nesse lugar intocável, nesse mundo inatingível, que guardei minha ilusão.

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